Oblívio – por Matheus Bensabat

Poucos dias após a internação da filha, resolveu voltar ao sítio em que vivera com os pais da infância à juventude, quando se mudou para o Rio. Precisava livrar-se da angústia, extirpar de si o remorso e reaver-se com o passado. Ao entrar pela estrada de terra pôde enfim ver a casa. Enxergava-a tão distante daquilo que fora, que não reconheceu as paredes que a constituíam. A impressão de abandono tornava-a esmaecida, fazendo-o sentir uma tristeza branda, como se ele se lembrasse de alguém a quem amara e que o tempo afastou.

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O velório da bela desconhecida

- por Marc Enrique Moret "Enquanto jogávamos punhados de terra no caixão, percebíamos pela primeira vez a solidão de nossas casas, a estreiteza de nossos sonhos, a baixeza de nossos ideais, diante do caixão da morta que morreu de susto. Mas ao pôr do sol sabíamos que tudo seria diferente: no São Conrado a lembrança da bela assustada viveria nos corações; e antes de tudo que fizéssemos de bom, teríamos pensado duas ou três vezes na morta de laços brancos que derreteu o remorso dos homens e mulheres. "

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Soraia – por Douglas Lobo

- por Douglas Lobo “Soraia se debatia. Arranhava os antebraços dele com as unhas. Através da água, Bernardo via o rosto dela se contrair, os olhos arregalados. Só a perdia de vista, por alguns segundos, quando uma onda quebrava sobre ele, os sulcos de espuma remanescentes a lhe dificultarem a visão. ”

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Morte Térmica

- por Marcel Novaes “A imagem na moeda era o rosto de um homem, de perfil, com algumas palavras em volta. Com um movimento da mão, ele fez a moeda virar. Do outro lado, havia um número 5 e a imagem de uma águia, pousada sobre uma coisa redonda. Dentro da coisa redonda, uma suástica. Em volta disso, as letras pareciam ser Deutsches Reich 1938”

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Otelo – por Andre Klojda

"Seus olhos perdidos foram fisgados pela moça que passava saltitante, sorrindo para o dia e para o mundo inteiro – sorriu também para ele, o pipoqueiro, que, por um momento, sentiu-se aliviado do fardo da melancolia. A alegria da moça tinha esse poder. Infelizmente, ela era rápida, leve, quase flutuava, e logo sumiu entre as pessoas e as árvores."

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O Caso Misterioso do Assassínio do Relojoeiro

- Gabriel Coelho Teixeira A lua vai alta. Abaixo, uma rua paira deserta. A madrugada avança. Na via pública as lâmpadas são escassas. Os halos de luz provenientes da queima do querosene são fracos, impotentes contra a força opressiva da noite. Em vez de se oporem à escuridão, incorporam-se nela, evocando ares fantasmagóricos.

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Heloísa

- por Matheus Bensabat Quando Heloísa completou a última volta na coroa, percebeu que a filha se encaminhava para a sala. Deixou o bastidor sobre a mesa e guardou os carretéis na caixa de costura, mirando-a. Amanda dirigiu-lhe um olhar pesaroso e culpado, desviando-o em seguida, encostando as costas no batente da porta. As olheiras destacavam-se no rosto alvo, e os passos, curtos e cadenciados, mostravam-na acuada. A mãe deteve-se, primeiro, nos machucados da mão, que ela não conseguira ocultar, e pelo olhar da filha, entendeu tudo. Heloísa começava a sofrer.

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Maria – por Andre Klojda

- por Andre Klojda "Aproximava-se o horário do fim do expediente, e Maria ainda não conseguira parar um momento sequer naquele dia: “Venha aqui”, “Vá acolá”, “Ajude-me um instante!”, suas colegas pediam. Com comovente solicitude, sem palavra agressiva ou mau pensamento, Maria atendia a cada uma."

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A casa, o sal

- por Juliana Amato "Não é possível saber a expressão de ambos sem chegar mais perto, e então vê-se a mulher em silêncio e lábios semicerrados, e o homem em silêncio e lábios semicerrados. Sem palavras, só o som assoviado do vento. O homem e a mulher caminham juntos em direção à casa, como se tivessem saído do mar,

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