– por Alexandre Bacelar Marques
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ROMANCE DO PRIMEIRO DOMINGO DO ADVENTO
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Devia Tomás estar
com esta: trava-línguas
há horas embargando
o fluxo do pensamento,
pois rápido encontrou,
oculta pelo banco
da frente do automóvel,
uma peça de metal
do ar-condicionado
(era uma serpentina e,
Deus sabe por quê,
pusera-a eu ali.)
Era domingo, vínhamos
da missa de Advento.
Teresina, em dezembro.
“Mãe, sabes o que é isso?”,
abrindo grandes olhos.
Da frente, entreolhamo-nos.
“Isto é um trava-línguas”.
Rimos, rimos, rimos.
Rimos como se fôramos
uma cena involuntária
na memória de um anjo.
“Tomás, Tomás, Tomás…”
Então a Mãe: “trava-línguas
é a aranha-arranha-a-rã,
trazei-três-pratos-de-trigo
é ninho de mafagafos”.
Não quis Tomás porém
ouvir que pratos, tigres
mais travassem línguas
que aquela serpentina
de bruto cobre fulvo
ali em suas mãos.
Seu peito refolhou-se.
Chorou com seu fracasso
em fazer pousar o termo
na exata realidade.
Mas não por muito tempo.
Logo viu que seu irmão
ao lado agonizava,
“Três patos de trigues…
arranha arranha arranha…”,
“Mamãe mamãe mamãe!”
“O que é?” E triunfal:“Já sei!
O Pedro é um trava-línguas!”
E eu, olhando sua vitória
no reflexo do espelho:
“Tomás, Tomás, Tomás…”
Não é isto um trava-línguas.
Diga: “Mãe, Pedro é burro” —
ou tapado ou obtuso.
Mas não que é um trava-línguas.
A mãe ralhou comigo.
E rimos, rimos, rimos
como se estivéssemos
ali por providência,
ali como um clarão
na história do universo.
E de nós se ocupasse
talvez até um anjo
criado de repente,
protetor designado
da chuvosa estação
neste sertão de Deus.
De nada disso quer
Tomás ouvir falar.
Momentos, Universo,
a própria Providência,
anjos, no que lhe concerne,
são palha, drama vão
vãs especulações,
não-palavras.
Tomás só quer chorar de novo.