Um jeito mais feliz de sentir dor – poemas de Antonio Ribeiro

Os séculos são uma coisa móvel.
Assim como não há o que havia,
o nada sobra e tudo tende à morte.
Gosto da vida como ela me ocorre –
um dia remendado em outro dia.
Tenho vinte e seis anos de preguiça… 

Será que ainda tenho a alegria 
de quando, bem sozinho, me lembrava
que Abel colhia os bens que a terra dava
que o chão, a grama e o resto lhe sorriam
que só viver no mundo lhe bastava,
e que por isso recebeu favor? 

Vento que me sopraram nas narinas
que tipo de mensagens vai dizer?
O que diz uma noite sobre o Amor?
Quem somos, neste dia de primícias?
Pobres na manjedoura, a perceber
Um jeito mais feliz de sentir dor? 

A sede no deserto 
os bichos num estábulo, 
o peso, a luz e o vácuo, 
as obras dos Teus dedos 
a estrela que caía 
o sono, a morte e o medo, 
vão todos esperando 
a tal boa notícia 
que vem dependurada 
num ventre de menina 

(Menino, as horas de tudo são tuas.
Ser gente é difícil, e vão te matar.)

Além-bar 

Me encosto num balcão de bar 
e se o mundo acabasse agora 
terei deixado um olhar torto 
sobre a superfície das coisas.

não estou preso no meu corpo 
a minha luta é espiritual 
contra as potestades do alívio 
contra os espíritos da brisa.