O Pote de doces – conto de Gabriel Coelho Teixeira

Era uma tarde remansosa de domingo quente e abafado. Na varanda do casarão, o senhor proprietário de terras oscilava preguiçosamente na cadeira de balanço, indo e vindo, indo e vindo, a barriga estufada e pesada do almoço. Ao lado dele, na mesa, estava a esposa, entretida em alguns afazeres pessoais. Em certa altura, a mulher decide chamar pela mucama.

A escrava atende prontamente o chamado da patroa, em poucos segundos já está na varanda. Era uma preta jovem, na casa dos dezessete anos. O proprietário a havia adquirido há poucos meses para tomar o lugar da preta velha que havia morrido e deixado a casa desassistida. A esposa, no entanto, com muito esforço tolerava a presença da nova mucama. Sabia que os senhores de terras se permitiam certas liberdades com as escravas, e a presença daquela preta jovem a deixava enciumada.

— Traga-nos alguns doces — ordenou.

A escrava voltou para o interior do casarão. Enquanto se afastava, a mulher a fitava pelas costas. Quando sumiu, voltou o olhar desconfiado para o marido. O homem balançava preguiçoso na cadeira, indo e vindo.

Pouco tempo depois reaparece a mucama com um pote de doces. Ia se dirigir direto à mesa para primeiro servir a senhora, mas antes de passar por trás da cadeira de balanço onde seu senhor descansava, o homem a chamou para que o servisse. A preta então foi primeiro até ele. Aproximou-se e se debruçou para atendê-lo.

Nesse momento, com a inclinação do corpo, sua camisa puída e esgarçada deixou os seios à mostra. O senhor não pôde evitar de se deixar levar pela atenção que despertavam os seios da jovem mucama, com o brilho do suor reluzindo na pele escura e os bicos rígidos escapando da camisa. A preta ajeitou-se logo e tratou de levantar o corpo após servir o homem. Nem reparou que do outro lado a senhora a fulminava com um olhar irascível. Aproximou-se da mesa com a cabeça baixa, pôs o pote de doces à disposição da sua senhora e retirou-se assim que a mulher a despachou secamente.

Tão logo a preta sumiu, o marido, num golpe de distração e imprudência, deixou escapar um comentário sobre a beleza dos seios da escrava.

A mulher ensandeceu.

***

Na manhã do dia seguinte o senhor proprietário de terras precisou viajar até a cidade para resolver algumas pendências de seus negócios e tomar outras providências. A viagem era demorada, assim como os procedimentos necessários. Acabou levando mais tempo fora do que pretendia. Conhecendo o temperamento da mulher, sabia que se irritaria com a ausência prolongada. Para amenizar a irritação, tratou de levar para ela uma lembrança comprada na cidade. 

Era já perto do final da tarde de quarta-feira quando chegou no casarão, o pôr-do-sol espalhava pelo céu uma grande mancha rubra.

Animado, desde fora já gritava anunciando sua chegada. A mulher apareceu na varanda para recebê-lo. Os gestos dela eram meigos e o sorriso doce e acalentador.

O homem tratou logo de entregar à esposa o presente que comprara na cidade. A mulher demonstrou surpresa e retribuiu a gentileza anunciando:

— Também tenho um presente para você.

Entraram na casa.

Já na sala, a mulher foi até o centro do recinto, apanhou um objeto que estava sobre a mesa e entregou-o ao marido.

Ele reconhecia aquele objeto. Era um item da casa. Era o pote de doces, ainda tampado. Portanto, nenhuma surpresa ali. O presente certamente estava dentro.

A mulher olhava carinhosamente para o marido enquanto ele abria, animado e ansioso, a tampa do pote de doces. De repente, o sorriso estampado no rosto do homem desapareceu. Seu rosto adquiriu uma expressão transtornada.

Dentro do pote de doces estavam os seios da jovem mucama.