Entra Hamlet.
HAMLETAh, vai ser agora, agora que está rezando,
Sim, é agora mesmo. (Desembainha a espada)
E aí ele vai para o céu!
E assim fico vingado. Isso exige exame.
Um crápula mata meu pai, e, por vingança,
Eu, o único filho, envio o mesmo crápula
Para o céu.
Quê? Isso é paga e prêmio, não uma vingança.
Ele ceifou meu pai, túmido, empanturrado,
Com os crimes viçando feito um maio lúbrico;
E suas contas, como ficaram? Só os céus sabem.
Mas nesse nosso mundo e modo de pensar,
Suas contas são pesadas. Então, isso é vingança,
Se o apanho no instante em que purga sua alma,
Preparado e maduro para a transição?
Não.
Detém-te, espada, espera o instante mais horrendo:
Quando estiver roncando, bêbado ou colérico,
Imerso na volúpia incestuosa do leito,
Blasfemando num jogo ou fazendo uma coisa
Sem nenhum perfume sequer de salvação,
Derruba – que ele vai chutar os céus co’os pés,
Ficar co’a alma preta e manchada feito o inferno,
Que é pra onde ele vai. A minha mãe me aguarda.
Tal droga só protela a tua hora bastarda. (sai)
Este é o último solilóquio da terceira cena, terceiro ato, da peça Hamlet,¹ de Shakespeare, cuja tradução aqui apresentada é do poeta Lawrence Flores, uma das melhores ou senão a melhor em língua portuguesa. Exemplos desse feito espalham-se ao longo da peça, como a capacidade de extrair, no vernáculo, ao estilo adornado de algumas passagens a mesma energia poética, a mesma rispidez e brutalidade das paixões, algo próximo ao naturalismo por antecipação, ou simplesmente uma herança medieval de que o naturalismo tirou proveito como se novidade fosse, que muitos só alcançam pelo discurso corrente: “Quando estiver roncando, bêbado ou colérico,/Imerso na volúpia incestuosa do leito (…)”, qualidade essa que se estende no humor venenoso, sarcástico e cuja dicção elegante se mantém mesmo por meio de vocabulário a poucos passos do fescenino: “Para esse aí tem que ser sempre uma história bufa ou de putaria, senão ele pega no sono e ronca.”(ato II, cena II, vv. 516-18)
Como muitos exemplos há dessa qualidade tradutória, na qual o tradutor não incorre no vício de algumas adaptações contemporâneas de desmistificar a linguagem de Shakespeare por meio de uma agramaticalidade pretensamente revolucionária ou pela planificação dos meios expressivos, como se fosse um poeta mimeógrafo elizabetano, voltemos ao dito solilóquio, que é sem dúvida o trecho mais forte de toda a peça e revela um espírito no grau significativo da perversidade.
Hamlet não é um vilão, contudo seus momentos de vilania, que parecem se sedimentar perigosamente ao longo da trama, concorrem com Macbeth e Ricardo III, cujos nomes intitulam as obras de que fazem parte, também com Aron, da peça Titus Adronicus (Aron will have his soul black like his face, diz Aron enquanto planeja sua próxima perversidade), Edmund, de Rei Lear, e Iago, de Otelo, que são grandes maquinadores do mal. Desse modo, soa exagerada a tão propalada hesitação hamletiana. Nesse solilóquio a hesitação é aparente. Melhor dizendo, sequer é uma hesitação. É antes, por assim dizer, um recuo estratégico a fim de que a vingança se realize de maneira plena. Ele viu a oportunidade de matar o tio, percebeu que era um momento propício, que este lhe estava às mãos e às quais não havia escapar. Houve sim uma decisão. Por outro lado, resolveu não levar adiante o que pretendia não por estar em dúvida a respeito do que queria fazer, e sim porque, como é claro no monólogo, se por um lado o seu tio não escapou à morte física, por outro, com estar rezando, ganhava as graças celestiais, indo direito para o céu, e a vingança tão desejada não se alcançava. Dito isso, ele manteve a decisão, contudo só aceitava executar seu intento numa situação em que o então rei estivesse desprotegido espiritualmente por estar chafurdado na baixeza, como luxúria ou gula, por exemplo.
Acusador ou anjo da vingança?
Para ele [Dover Wilson], nosso herói não hesita coisa alguma. Ao contrário: trata-se de um carácter activo e empreendedor, capaz de planejar e executar (a peça armadilha, a sua loucura fingida, a execução sumária de Rozencrantz e Guildenstern). Se demora a vingar o pai é porque, na mente protestante da época, a crença nos fantasmas havia sido fortemente abalada, de modo que Hamlet junior tem de certificar-se do que o finado Hamlet lhe revelara. Ora, nessa verificação, ele é todo empenho, despacho e resolução.(“Psicanálise, arte e literatura”, in Colóquio/Letras, n. 44, 1978, Fundação Calouste Gulbenkian, p.13-14)
Ao que expus no parágrafo anterior, José Guilherme Merquior, citando Dover Wilson, acrescenta o espírito renascentista, mais apegado à visão algo empírica da natureza humana, opondo-se dessa forma aos elementos espirituais que são tomados como superstição católico-medieval, tudo isso expressado numa versão mais progressista e iluminista do cristianismo que é o movimento protestante, do qual algumas de suas vertentes rejeitam a ideia da existência de demônios, de modo que não há uma hesitação, e sim uma busca decidida por respostas claras. Mais, mesmo movido pelo sentimento de vingança, Hamlet quer que a justiça — ou o que entende por justiça — participe desse sentimento, com isso se isola para meditar a respeito do que está acontecendo e, para ganhar tempo e precaver-se contra a descoberta de suas intenções, resolve fingir loucura, e até mesmo apela ao recurso à “peça armadilha”; vale-se de elementos e instrumentos, próprios de uma investigação policial, que certo influenciou a fatura do juiz de instrução do romance Crime e castigo, de Dostoiévski, o qual em vez de prender Raskolnikov na primeira oportunidade, conversa com ele, discutem algumas teorias revolucionárias do momento, até levá-lo, qual o padre Brown, de Chesterton, ao reconhecimento da gravidade do crime que cometeu e, dessa maneira, confessá-lo e fazê-lo entregar-se de livre e espontânea vontade. Claro que há uma diferença fundamental entre o que faz o policial de Dostoiévski e o uso da peça armadilha por Hamlet: aquele busca extrair a Raskolnikov uma confissão semelha à confissão que se faz diante de um padre e pela qual se busca salvar a alma convertendo o pecador, interessa-lhe mais que a misericórdia cumpra seu papel, sendo esta mais importante que a justiça mesma, ao passo que Hamlet não se interessa por que seu tio salve sua própria alma, Hamlet, qual uma vítima que se quer triunfante, em verdade não admite que o rei Cláudio morra sem saber a razão de estar morrendo, quer alcançar dele não o arrependimento, quer o remorso, mais uma vez, não anseia salvar alma alguma, deseja que seu tio sinta-se frustrado e inundado por uma fúria impotente, por saber que seu crime foi descoberto, que seu crime não foi perfeito.
Martin Lings, escritor e místico inglês, assim como Dover Wilson, não vê hesitação em Hamlet. O fato de o príncipe não ter matado o rei naquele momento não teria que ver com hesitação, e sim com perceber que este momento não era ideal para matar o regicida. Afinal, o príncipe não apenas deveria matar Cláudio bem como deveria ir mais adiante, matar-lhe a alma, fazer o que lhe estivesse ao alcance para evitar que o então rei fosse para o Céu. A não ser assim, resolveria tão-somente uma pendência pessoal, enquanto o reino permaneceria em crise. Lings, porém, não chega à conclusão a que chegou sem antes fazer uma pergunta incontornável: “Que pecado pode se comparar à implacável determinação de mandar uma alma para o Inferno? E como uma malevolência assim tão aterradora, pior do que qualquer coisa de que o homem Cláudio seja culpado, poderia reconciliar-se com a nobreza de caráter de Hamlet?² Logo em seguida, porém, ele escreve: “Essas considerações não se aplicam, entretanto, ao pretexto se tivermos em mente o significado místico de vingança.”³ Sobre esse significado, direi algo mais adiante. De qualquer forma, conforme a interpretação mística de Lings, Hamlet não estava sendo cruel ou demoníaco, na verdade resolveu aguardar Satã revelar-se a olhos vistos, pois aquele momento era o momento em que “a manifestação de Satã em Cláudio recua”,⁴ “o dragão ainda não saiu a campo aberto. Ou, em outras palavras, Hamlet ainda não alcançou o fundo do Inferno. Ele ainda não teve qualquer experiência da completa vileza de Cláudio.”⁵ Da mesma forma que os exorcistas só conseguem dar o passo mais efetivo quando o demônio possessor lhes revela o verdadeiro nome é que, uma vez descoberta a verdadeira natureza do rei, poder-se-á matá-lo “e assim eliminar o ‘pecado original’ que resulta do domínio satânico.” A cena da peça armadilha é de alguma forma, se pensarmos bem, um rito de exorcismo, tudo se esclarece naquele momento, o rei se sente incomodado, a rainha o percebe e Laertes é como que iluminado por uma revelação e subitamente alia-se a Hamlet para matar o Dragão, e isso parece corroborar a interpretação de Lings. Porque, ainda segundo Lings, Cláudio não é apenas um regicida, “é a ‘Serpente’ que foi responsável pelo fato de Adão ter se tornado mortal e que desse modo ganhou o domínio sobre toda a raça humana”,⁶ em suma, a vingança e o envio de Cláudio ao Inferno se justificam porque Hamlet não conta apenas a história de um reino em crise, é outra maneira de contar a história da Queda. Não precisamos, pois, nos preocupar com o que teria acontecido à alma do rei, uma vez que este não é ninguém menos que Satã, e Hamlet, por sua vez, um membro da milícia celestial.
Por mais que seja uma interpretação muito rica, como sói acontecer às interpretações simbólicas, por outro lado, o aspecto cristão que prevê uma meditação mais acurada sobre a natureza da vingança parece ficar empalidecido — se bem que Lings não é cristão, façamo-lhe justiça, mas um muçulmano converso —, e assim é como se a peça não apresentasse nenhuma contribuição que a um só tempo a articule às tragédias gregas e lhes acrescente outros elementos, indicando outros caminhos, como a contribuição gnóstica da criação do indivíduo pela investigação interior, conforme o diz Harold Bloom em seu Invention of Human, parece assim diluir-se na cosmologia de várias religiões, inclusive as pagãs, que ou divinizavam as vítimas ou lhes conferiam uma identidade sobrenatural maléfica para justificar seu sacrifício e também essa interpretação parece se articular com a distinção que, segundo Lawrence Flores na introdução, faziam “alguns politicólogos do período”, a saber, a “‘vingança do particular’ e a vingança de um príncipe contra um tirano usurpador.” Embora seja um princípio adotado no meio secular, essa distinção guarda uma herança sagrada, como de resto todas as instituições seculares.
A desforra do príncipe era justa quando as instituições estavam maculadas pelo crime e quando não houvesse outro artifício senão ela. Era a vingança o último meio para restabelecer o estado de coisas realmente “legal”, porquanto a legalidade havia sofrido um atentado que punha em risco a própria existência do reino e do cosmo.⁷
Para reforçar sua tese, Lings atribui ao discurso de Hamlet um caráter meramente retórico, como se estivesse brincando com uma convenção: “Não se pode imaginar que um homem com a inteligência espiritual de Hamlet poderia sinceramente acreditar que é assim tão fácil ir para o Céu, e que um homem tão perverso como Cláudio poderia conseguir isso simplesmente morrendo enquanto está ajoelhado em oração.”⁸ De fato, não esperemos essa facilidade toda, não contemos com algo conformado ao que disse Emanuel no Alto da Compadecida, de um inferno “feito repartição pública, que existe mas não funciona.” A mim, entretanto, me é difícil ver a ida ao Céu condicionada a uma espécie de iniciação, algo swedenborguiano, ou próprio do elitismo gnóstico de Harold Bloom,⁹ e não como resultado do arrependimento e da Graça. E como veremos mais adiante, Cláudio, em verdade, se vai para o inferno não é por ser Satã, mas sim porque não quis abrir mão dos privilégios que o crime lhe conferiu.
René Girard, por outro lado, lança luz sobre um aspecto da peça que aparentemente corrobora as interpretações convencionais acerca da hesitação, ao pôr em xeque a utilidade da vingança:
Se a vasta literatura crítica sobre Hamlet um dia caísse nas mãos de pessoas que desconhecessem nossos costumes, elas não deixariam de concluir que nossa tribo acadêmica deve ter sido muito selvagem. Após quatro séculos de controvérsias, a relutância temporária de Hamlet em cometer assassinato ainda nos parece tão esquisita que cada vez mais livros são escritos no vão esforço de solucionar esse mistério. A única maneira de explicar esse curioso corpus crítico é supor que no século XX bastava um fantasma fazer um pedido, e o professor médio de literatura massacraria toda sua família sem levantar as sobrancelhas. (“A aborrecida vingança de Hamlet-Vingança em Hamlet”, in Shakespeare: Teatro da inveja, René Girard, trad. Pedro Sette-Câmara, É realizações, 2010, p. 526)
Acontece, porém, que essa interpretação de René Girard, bem como a citação de Merquior, também tira a hesitação ao centro da trama pondo em destaque a necessidade de se tomar uma decisão fundamentada em respostas claras, em provas inequívocas. Como previsto nas leis penais, a execução tem de ser precedida por uma investigação, e não podemos deixar à execução vingativa o monopólio do espírito empreendedor, investigar é sempre parte da ação, é uma atitude, é uma iniciativa; recordando Merquior, “nessa verificação, ele é todo empenho, despacho e resolução”. Isso é de alguma forma corroborado no que diz Lawrence Flores sobre Shakespeare ter transformado
a vingança em um problema, em uma questão. Em vez de encenar a estratégia e as tramas que são comuns ao ato de vingança, com seus saltos espetaculares em que a justiça se realiza na mão de um herói, o Hamlet de Shakespeare parece mais determinado por acidentes, indagações, dúvidas e impasses.” ¹⁰
Essas “indagações, dúvidas e impasses” têm a ver, como já dito, com a busca de respostas claras. Não poderia ser de outra forma:
[Shakespeare] deu ao seu fantasma traços ambíguos, a um só tempo divinos e demoníacos, inscrevendo, nas entrelinhas da peça, as discussões pós-reformistas sobre a natureza das aparições espectrais na esfera mundana. Com um fantasma tão dúbio, o trabalho do vingador não poderia deixar de se complicar ainda mais.¹¹
Do contrário, em ultrapassando essas interrogações, pondo-as de lado a fim de partir para a execução imediata, Hamlet não seria um homem, e sim um membro “da tribo acadêmica” de que fala Girard, quiçá uma personagem mitológica cuja decisão final é menos sua que dos deuses, sintetizados pela figura do fantasma ou pelo espírito do tempo. Contudo, há algo mais que também não pode ser ignorado, já no título “A aborrecida vingança” Girard faz com que sua interpretação distinga-se da anterior ao sugerir que as maquinações de Hamlet são menos um ato da vontade ou mostra de diligência que a desconfiança mesma da vingança, que não lhe parece fazer muito sentido. É como se o sentimento residual de honra, já enfraquecido pelos novos tempos, fora de moda, levasse-o a contragosto a desempenhar um papel: seu pai não poderia morrer em vão ou, como se diz hoje em dia, morrer de graça.¹² Shakespeare, por meio de sua personagem, de um lado questiona a validade ou a necessidade da vingança, ao mesmo tempo em que, ao menos na aparência, fá-lo por meio de uma história de vingança atendendo de alguma maneira à convenção do gênero, é o gênero (ainda seguindo Girard) que denuncia os princípios que movem o próprio gênero, não à-toa isso é sugerido até mesmo em discursos proferidos, e com muita sensatez, por vilões, livrando assim a trama do peso caricatural que recai sobre os antagonistas, como uma forma de marcá-los com o sinete inequívoco do mal:
É doce e louvável em vossa essência, Hamlet,
que ao vosso pai prestes os deveres do luto.
Mas lembrai: vosso pai também perdeu um pai,
e esse perdeu o seu, e assim ficou o filho
por algum tempo preso ao dever de prestar-lhe
as tristes honras fúnebres. Mas persistir
agarrado à aflição do luto é uma postura
de teimosia ímpia, é um pesar não viril,
revela uma vontade que hostiliza o céu,
um coração sem fibra, uma mente impaciente,
um juízo simplório e sem discernimento;
pois o que se sabe, se aceita. É tão trivial
quanto tudo o que nos ocorre de tão banal.
Por que temos, teimosos e recalcitrantes,
de insistir na aflição? Não! É uma ofensa aos céus,
aos mortos e à natureza, um descalabro
aos olhos da razão, cujo tema comum
sim, é a morte dos pais, e que sempre gritou,
do primeiro corpo até o que morreu hoje:“
Assim é”. (…)
(Ato I, cena II, 87-106)
Esse discurso edificante, que é sem dúvida um dos discursos mais sábios jamais ditos em obras literárias, de uma lucidez inequívoca, numa transposição eficiente do discurso sapiencial ou sentencioso ao universo lírico-dramático, e de tal maneira essa eficiência se mostra que não abarrota os versos, porque de fato mimetiza a natureza da fala, termina por cumprir uma função irônica na peça, uma vez que o fratricida teria muito que perder se a verdade fosse descoberta. Porém, a verdade que se expressa nesse discurso é tão evidente que às vezes custa acreditá-la apenas uma artimanha, é de se crer que ele realmente se incomoda, ao menos episodicamente, com o efeito que seu mal produziu, e num dos momentos da peça o rei, em sua solidão, justamente aquele momento flagrado por Hamlet que o faz protelar a vingança, interpola na prece esse incômodo e suas inconveniências:
Meu crime está infecto, um ranço sobe aos céus;
Pesa-lhe aquela velha maldição primeva
De matar um irmão! (…)
……………………………………………………………………
…. E se essa mão maldita
Ficar inda mais grossa com sangue fraterno,
Não terá chuva que baste nos brandos céus
Que a limpe em cor de neve.
É evidente, contudo, que ele pondera as conveniências do seu estado atual,
…mas que prece agora
Pode me servir? Como perdoar o assassínio?
Não é possível, pois ainda estou em posse
Dos bens pelos quais cometi o assassinato —
Minha rainha, a coroa e a própria ambição.
ecoando, todavia por uma inversão especular, a famosa passagem de Santo Agostinho:
Eu, porém tão jovem, tão miserável desde o despertar da juventude, tinha implorado a ti a castidade dizendo: ‘Dá-me a castidade e a continência, mas que não seja para já.’ Pois temia que me atendesses logo e me curasses imediatamente do mal da concupiscência, que eu achava melhor satisfazer que extinguir. (Livro III, 17):¹³
Essa ponderação, todavia, não o livra do fantasma do crime e do fantasma do próprio perdão, que exigiria uma mudança radical da sua vida, o efeito do perdão que se busca seria, desse modo, o mesmo diante da escultura em “O torso arcaico de Apolo”, na tradução de Bandeira, “força é mudares de vida”:
O perdão, pra que serve
senão pra confrontar o semblante do crime?”(…)
Como obter perdão e retendo os bens do crime?”
Nos tortos cursos deste mundo, a rica mão
Do crime pode sempre enxotar a justiça,
E é comum constatar que o lucro sujo — é ele
Que compra a lei. Mas lá em cima é diferente.
As burlas são vãs, lá nossa ação revela-se
Exata como é, e somos compelidos,
Num sério face a face com nossos pecados,
A prestar testemunho.(…)
Quod est tu nomen?
A julgar por essas sucessivas oscilações na alma do rei, a mim me parece um erro, como o faz Lings, esperar que a maldade, outrora tão oscilante, se transforme “numa fixação”,¹⁴ que ele interpreta como solução para uma crise, sugerindo não apenas a morte do monarca, mas também a condenação da sua alma, tirando-lhe qualquer oportunidade de arrependimento, quando essa crise poderia ser resolvida, no plano mais exotérico, pelo arrependimento de Cláudio e a aceitação da pena legal. Não é que eu queira que a peça vá por esse caminho, trata-se de tentar entrever na trama e nas ações do monarca o que, graças a uma escolha “segundo a carne”, ele deixou de fazer. Rememoremos um caso de grande gravidade, que causou grande comoção, o de Gilles de Rais, um infanticida satanista, responsável pelo assassinato e abuso sexual de centenas de crianças, em ritos de missa negra, no seu condado, conforme a narração apresentada em La Bas, romance de Joris-Karl Huysman, cujo arrependimento e rendição restauraram o equilíbrio da comunidade local, dispensando-se assim o linchamento ou a justiça com as próprias mãos. No plano mais elevado, poder-se-ia pensar em exorcismo, nada na peça, entretanto, indica que o rei seja um possesso, é alguém, como o rei Saul, de quem o espírito de Deus se afasta na medida em que se distancia do mesmo Deus por apoiar-se em desespero em soluções tão imediatas na sua resposta quanto danosas para sua alma, no caso, os privilégios mundanos decorrentes do crime. Os que estão mais próximos a isso é o próprio Hamlet, cujo crescente espírito vingativo deixa, como será exposto mais adiante, um rastro de destruição, endurecendo-lhe o coração, tornando-se “numa fixação” ou o próprio fantasma, que é mais identificável com uma entidade maligna, a qual é forçada a desaparecer toda vez que se ouve o canto do galo, que parece sugá-lo de volta às trevas:
BERNARDO
E já ia falar, quando o galo cantou.
HORÁCIO
E teve um sobressalto como um ser culpado
Que está diante uma apelação. Ouvi dizer
Que o galo, essa trombeta da hora matutina,
Com sua estrídula e intensa garganta, desperta
O deus do dia, e ao menor sinal do chamado,
Que no fogo ou no mar, quer na terra ou no ar,
A alma errante e sem rumo procura o recesso
De sua prisão. É fato a que esta verdade
O presente objeto traz comprovação.
(Ato 1, cena 1,vv. 152-62)
Retomando a tão debatida hesitação, Martin Lings de alguma forma relativiza essa visão ao dizer que
diferentemente de Othelo e Lear, [Hamlet] é um excelente psicólogo, e conhece a si mesmo tanto quanto conhece os outros.¹⁵ Além disso, se é lento para agir, é rápido para pensar, e não demora em substituir o impulso momentâneo de lançar-se à vingança pela consciência de que o mandato depositado sobre ele pelo céu constitui uma tarefa insuportavelmente difícil.¹⁶
Essa interpretação é análoga às anteriores, distinguindo-se porém delas na medida em que, com diferentes graus, se por um lado a impulsividade vingativa substitui-se não pelo medo de agir, e sim por uma busca de uma visão em perspectiva, privilegiada, por outro, a razão que é defendida pelo homem renascentista e logo depois pelos iluministas, é mais fisiológica, mais cerebral, a que falta uma presença espiritual. Na visão de Lings, a razão só merece esse nome (e a qualidade da razão não é negada por Lings, “é um excelente psicólogo, e conhece a si mesmo tanto quanto conhece os outros”) na medida em que se abre ao Céu, e justamente por isso depara com um desafio algo semelhante ao que se pode depreender de Dover Wilson, citado por Merquior, ou seja, agir como um místico num período esclarecido. Se por um lado, o Hamlet de Lings não padece da mesma descrença renascentista, por outro aceitar o mandato do Céu, ou seja, vingar-se, mesmo que seja para restaurar a ordem do reino, não deixa de ser um desafio, “uma tarefa insuportavelmente difícil”, essa vingança, afinal, seria menos um desejo do mesmo Hamlet que o desejo de Deus, e nisso parece desautorizar antecipadamente a interpretação girardiana, que é cristã, ao repor a vingança não apenas num lugar privilegiado, assim como também é um instrumento divino, enfim, há um elemento fortemente iniciático.
Não se trata de favorecer uma interpretação piedosa para se contrapor à interpretação simbólica, e sim porque Lings atropela pormenores de grande importância. No geral, tudo corrobora a interpretação que ele faz, acrescentando um elemento muito rico e em muitos pontos incontornáveis às peças do bardo. A questão é que esses pormenores conduzem a outras direções que a leitura de Lings ou ignora ou não considera. O problema, pois, não é a interpretação mística em si, e sim uma interpretação mística que se circunscreve a uma cosmologia primitiva, com a qual o Bardo só está relacionado parcialmente, que lhe é apenas um ponto de partida, a estrutura literária é antiga, pagã, é a estrutura das tragédias, mas o espírito não o é. O famoso trecho “O tempo está disjunto. Oh, despeito imundo,/ que para endireitá-lo eu tenha vindo ao mundo!”(ato I, cena V, vv.196-7) parece corroborar a tese da vingança como mandato divino, conforme a já dita cosmologia primitiva. Essa frase também pode refletir menos o destino determinado por Deus (que para endireitá-lo eu tenha vindo ao mundo!) do que reflete o sentimento de missão misturado ao senso de urgência que a perda do pai por assassinato pode causar, é algo de natureza mais psicológica que mística, algo muito próximo ao que W. H. Auden afirmou a respeito das peças elisabetanas, “quando uma pessoa sofre um mal, leva seu rancor longe demais e Nêmesis se volta contra ela – Shylock é um exemplo. O que era um dever agora se torna uma questão de paixão e ódio.” Ou seja, esse rancor que se leva longe demais, que se ajusta à estrutura da tragédia, não é algo que os deuses determinam, não é um destino que os deuses projetam, mas um permitir-se inclinar-se às forças das emoções mais imediatas, às quais é fácil ceder.
Northrop Frye, crítico, teórico literário e autor de Anatomia da crítica, parece, por sua vez, a recolocar as coisas nos eixos:
A vingança é geralmente considerada pela platéia um ato positivo de punição, que volta a equilibrar a normas morais da sociedade. Dessa forma, a platéia geralmente compartilha os sentimentos do vingador. Como na Bíblia se afirma que Deus disse “A vingança me pertence”, nas tragédias do período o vingador é em geral considerado um agente da vingança divina, seja qual for o próprio status moral. Particularmente na tragédia, percebemos o quanto o homem insiste em criar seus deuses à própria imagem e semelhança, não vendo nenhuma incongruência no fato de uma vingança humana aterrorizante e feroz muitas vezes ser considerada portadora do desejo divino.”¹⁸
Ou seja, além do erro de Lings, ao sugerir que o mal em Cláudio se transforme “em fixação”, como exposto anteriormente, sob o pretexto de que uma vez revelado, estaria mais vulnerável aos anjos da vingança, ele acaba colocando a si mesmo no mesmo nível expectativo da plateia, que se deixa conduzir pela personagem em vez de ver o todo que a peça expõe, conferindo a essa expectativa um adorno sagrado.
O escudo divino: a vingança me pertence
Sem dúvida há a história da Queda, como o afirma Lings, levar todavia essa interpretação às últimas consequências obnubila outras possibilidades de leitura que não podem ser ignoradas sem correr o risco de compreensão incompleta e cuja fonte é também bíblica, como a que podemos ler no primeiro livro de Samuel. As hesitações de Hamlet ou as procrastinações refletem os diversos momentos em que David, cada vez mais hostilizado pelo rei Saul a ponto de ver sua vida em risco, teve oportunidades incontestes de matá-lo e assim ver-se livre desse tormento, contudo recuava porque sabia que o rei antes de ser um vilão era um ungido de Deus. Ele percebeu que a promessa que Deus fez de lho entregar não era bem naquelas condições. Isso, por sinal, de alguma forma retoma a história da Queda, Saul foi ungido por Deus, assim como Adão e Eva, que embora tenham sido expulsos do Eden, Deus lhes deu condições para que pudessem viver fora daquele espaço sagrado, e isso é também uma espécie de unção.
E também Caim, o qual, posto tenha sido condenado a vagar na terra após ter matado Abel, Deus marcou-o a fim de que este não fosse linchado.
Há um paralelo muito revelador, David teve oportunidade de matar o rei em ciladas, em momentos de certa tranquilidade, ele vê, porém, a promessa de Deus cumprir-se no momento caótico da guerra, quando Saul, entrevendo a derrota contra os filisteus, lança-se sobre a própria espada, uma vez que seu escudeiro recusara a atender seu pedido para ajudá-lo a matar-se, porque este sabia-o, como já disse, ungido por Deus. Hamlet entretanto apressa, de alguma forma, a morte de Cláudio, mas isso acontece também num momento caótico, que envolvia um duelo e uma trama de assassinato perpetrada pelo rei por envenenamento, e no fim a família real se extingue naquele instante, e os filisteus da vez eram os noruegueses liderados por Fortimbrás. Isso, porém, até certo ponto. Considerando que Hamlet admirava em Fortimbrass a invulnerabilidade a impedimentos que ele mesmo, por força das circunstâncias, não tinha, este, por seu turno, prestando honras militares a Hamlet, leva-nos a ver o príncipe da Dinamarca como que se prolongando no príncipe da Noruega, restaurando assim a ordem que se acreditava perdida no último ato.
O caos a que referi é um paralelo interessante, uma vez que se relaciona com falta de controle, àquilo que não está sob o poder do homem. David teve de esperar o caos de uma guerra para que Saul morresse e assim cessassem as perseguições, momento esse que David não presenciou e, por isso, soube da morte de seu algoz apenas por uma testemunha, a qual, importa dizer aqui, ele executou por esta, seguindo caminho oposto ao escudeiro de Saul, ter atendido ao pedido deste de terminar de matá-lo, desrespeitando assim a unção divina; analisando por uma via mais mesquinha, maliciosa, David não teve o grande prazer de ver seu algoz morrer pelas próprias mãos, nem mesmo lhe foi concedido vê-lo morrer na mão de outrem, e ainda teve a tristeza de saber que seu grande amigo Jônatas, filho de Saul, também morrera na batalha e teve seu corpo exposto junto com o corpo do monarca como troféu macabro dos filisteus. Hamlet, por sua vez, não matou o rei quando teve oportunidade de fazê-lo mais tranquilamente e, aparentemente sem risco para a própria vida, foi preciso haver um duelo que descambou para uma situação fora de controle para que conseguisse realizar seu intento e, uma vez tendo-o conseguido sob uma forte emoção, é como se a um só tempo o rei morresse por assassinato vingativo, atendendo aparentemente à convenção, e fosse vítima do caos que ele mesmo acabou criando, como se a loucura antes fingida se tornasse uma realidade (e consideremos que a loucura foi vista outrora como manifestação divina), de modo que talvez tivesse sido vítima da vingança que estava nas mãos de Deus, não exatamente da vingança de Hamlet, que aí sim pode ser visto como instrumento divino dessa vingança, como o pretende Lings, talvez contrariando-lhe o espírito do homem esclarecido da renascença e, consequentemente, da plateia ainda ávida de vingança que queria a Hamlet todo o louro do feito.
Outro paralelo nessa narrativa não está apenas nos acontecimentos e na ordem em que acontecem, está também nas próprias personagens. Poder-se-ia dizer, grosso modo, que Hamlet é análogo a David, o perseguido, e o rei Cláudio, por sua vez, ao rei Saul, o perseguidor. Tomei cuidado, porém, de usar a expressão “perseguido”, na referência a Hamlet, em vez de vítima inocente. Mesmo essa expressão só faz sentido a partir de determinado momento da peça, porque o rei Cláudio só começa mesmo a empreender uma perseguição a Hamlet após este matar Polônio pensando ser o rei. Então, despacha-o, a pretexto de protegê-lo da fúria de Laertes, para a Inglaterra, onde na verdade esperava que fosse executado com o auxílio de Rozencrantz e Guilderstern, que o acompanharam; e depois, no retorno à Dinamarca, combina com Laertes uma forma de matá-lo, uma vez que o plano anterior falhara. Antes disso, porém, é Hamlet quem empreende uma investigação detalhada e começa a elaborar planos de vingança, não sem razão, é claro. Vemos, de qualquer forma, que os papéis de perseguidor e perseguido são alternados. Saul, força é dizer, não apenas espelha Cláudio, mas o próprio Hamlet, uma vez que Hamlet também, a pretexto de vingar-se também aos poucos “fixa” sua maldade, a ponto de, como já disse, atropelar muita gente no meio do caminho. Como, por exemplo, muito bem observou W. H. Auden, “quando mata Polônio, o faz com notável ausência de sentimento.”¹⁹
W. H. Auden, por sua vez, vê Hamlet mais como um entediado que um hesitante, “estranho que o tédio, em si tão moroso e impassível”, di-lo citando Kierkegaard, “tenha tanto poder de gerar movimento”,²⁰ alguém de imaginação prodigiosa, um artista, com grande capacidade de atuação e cuja crise de identidade, que leva às famosas procrastinações, deve-se ao fato de que ele tem, qual um poeta dramático, a capacidade de “imaginar o que qualquer pessoa consegue sentir, e ele começa a se perguntar: ‘o que sou eu?’, ‘O que eu sinto?’, ‘Eu consigo sentir?’”. Isso leva Auden a concluir que os “artistas tendem a sentir não emoção demais, mas de menos.” Isso, aliás, parece explicar a relação de Hamlet com outras personagens, como se fossem mais títeres que pessoas as quais de alguma maneira manipula, e com cujos sentimentos brinca. Em vez de sentir a tristeza pela morte do pai e ódio pela mãe por ter se casado com o assassino e rei usurpador, “acha a situação interessante, e toma notas sobre como ‘o homem pode sorrir e ser infame’”,²¹ como um escritor que se regozija diante da boa composição de suas personagens. Ele só age, segundo Auden, “quando as circunstâncias exteriores o ameaçam sob qualquer aspecto”.²² Daí, ele consegue ser implacável na hora de matar Polônio, “com notável ausência de sentimento”, e os amigos de infância Rosencrantz e Guildenstern, ou sob forte emoção na cena final, quando mata o rei. Ele é, ainda segundo Auden, comparável “ao herói trágico grego”, pior, ele “gostaria” de tornar-se esse herói, por ser este “uma criatura da situação. Daí sua incapacidade de agir, porque só consegue ‘atuar’, isto é, brincar com possibilidades.”²³ Isso, porém, é um tanto exagerado, certo cinismo ou ver algo sério como uma diversão não são necessariamente separados de um sentimento genuíno que subjaz as ações, fazem parte das oscilações emotivas a que qualquer ser humano está sujeito, talvez até um mecanismo de defesa contra os males da obsessão que podem impedir o obcecado de entrever outras possibilidades de ação, como um recurso mental para aliviá-lo da sensação de peso oriunda de uma decisão que se sabe tomada por própria conta, sem imposição ou auxílio dos deuses ciosos de vingança. Por outro lado, a obsessão de matar Cláudio ganhou tal dimensão que as pessoas das relações do príncipe tiveram sua dimensão humana relativizadas, de maneira que não lhe parecia de grande importância o destino de Polônio nem os sentimentos de Ofélia, afinal “O que era um dever agora se torna uma questão de paixão e ódio” ou, como um artista, olha para elas como se fossem suas personagens, que merecem mais sua admiração poética que sua simpatia.
Hamlet trucida o sono
Voltando ao solilóquio, Hamlet mostra que um homem honrado é também suscetível a vilanias, e não duvido que não fosse envenenado ao final da peça pudesse tornar-se num futuro Macbeth, que também era um homem honrado. Mas, ao adiantar-se a uma profecia, e informá-la à sua esposa, tomou gosto pelas intrigas e assassinatos; ou mesmo Ricardo III, que, numa disputa confusa de sucessão, que resultou em guerra civil, teve um dos irmãos e o pai executados, levando-o, assim, por sua vez, a exasperar o que de maléfico já havia nele, absorvendo na sua alma o que havia de pior nos seus rivais que ora se encontravam no poder, a resultar numa troca tão violenta de papéis, de vítima para carrasco, que esquecemos de que suas vítimas, entre as quais Margaret, viúva e rainha destronada, foram também capazes de vilanias indescritíveis, sádicas mesmo, de modo que podemos dizer que Macbeth e, principalmente Ricardo III, foram os hamlets que viveram um pouco mais, e cuja única diferença em relação ao príncipe da Dinamarca é terem meditado mais na natureza do mal que nos efeitos dos ciclos da vingança.
Quem realmente reflete sobre a vinganca, na peça Macbeth, é Malcolm, o qual se tornaria o sucessor da personagem título, no momento em que organizava uma ofensiva para derrubá-la:
MALCOLM
… Porém,
Quando esmagar ao déspota a cabeça,
Ou decorar com ela a minha espada —
O meu país não há de ser melhor,
E o mesmo sofrerá, ou mais ainda,
Às mãos do sucessor.
MACDUFF
De quem falais?
MALCOLM
Falo de mim – a quem conheço os vícios;
E tantos são, e tão endurecidos,
Que ao pé destes o negro coração
De Macbeth passaria por nevão,
E a Escócia acha-lo-ia um cordeiro
Pesando os meus agravos.
(Ato 4, cena 3)²⁴
Esse trecho, em que pese a verdade por trás do discurso, é pouco persuasivo, uma vez que se afasta das virtudes do contador de histórias — considerando aqui o icônico “narrador” segundo Walter Benjamin — e se aproxima irremediavelmente das “explicações” tão presentes nos romances, ou da “informação (…) que é incompatível com o espírito da narrativa”,²⁵ com seu didatismo típico de quem não consegue expressar a experiência tão-somente com a narração, que é a qualidade do contador de histórias. Essa passagem mais sabe à interpolação e, como se não bastasse, diante do desalento de Macduff, que o ouvia entre desesperado e desapontado, Malcolm estranhamente recua na dita confissão, “retrato-me da minha confissão:/ Aqui abjuro os vícios que jurei,/ que em nada representam o meu íntimo.(…)/ O meu primeiro falso testemunho/ foi sobre mim.”,²⁶ passando assim impressão de que pregou uma partida a seu amigo ou de uma sinceridade que é meramente cênica, exibicionista até, ou mesmo, concedo sem que isso sane essa fragilidade, segue uma antiga convenção literária de pôr o caráter do outro à prova (Macduff, o teu ardor, / pendão da integridade, desfaz dúvidas; / provou que é a honra em pessoa...), qual numa espécie de iniciação, como o faz Odisseu com Penélope no último canto da Odisseia, ou mesmo a cena da estátua em Contos de inverno ou como o faz Próspero na Tempestade à Ariel e ao pretendente de sua filha. Isso, porém, não se encontra em Hamlet, que é uma peça toda de ação, toda peripécias, um thriller avant la lettre, que já começa com o debate sobre a veracidade do aparecimento do espectro do velho Hamlet, “Pois então, surgiu de novo a coisa esta noite?”(Ato I, cena I, v. 24), segue-se a impressionante aparição, e o quase imediato desaparecimento, desse espectro (v. 54) aos olhos de uma guarda apavorada, dignos das melhores narrativas de horror, e sem dispensar, como na abertura da quarta cena, do primeiro ato, o clima e a atmosfera, que se tornaram uma convenção nas narrativas romanescas góticas do século XIX, que antecedem a aparição do fantasma:
HAMLET
O ar está cortante. Está realmente frio.
HORÁCIO
É um ar gelado, de fazer arrepiar.
HAMLET
Que horas são?
HORÁCIO
Falta um pouco pra meia-noite.
MARCELO
Não, já soou o sino.
Em tempo, é de se notar que a baixa temperatura do ambiente, quando não prevista, é associada com a presença demoníaca, como é frequentemente destacado nos relatos sobre exorcismo, e na peça essa presença é, como se sabe, um fantasma que, qual o demônio, é um espírito da vingança. Há também uma das melhores representações do suspense no teatro, do clima de tensão, que é o prenúncio tanto de uma guerra que ameaça o reino, “Isso agoura uma estranha erupção nesse Estado”(v. 72), ou mesmo – uma vez que a imagem é deliberadamente ambígua em relação à qual das duas situações realmente refere – do estado de intranquilidade que Hamlet começa a criar com seu desvario no decorrer da peça, além de uma eficiente tradução em versos dramáticos do estado de apreensão – reparem no poderoso símile, “num trabalho que funde o domingo à semana” – que causa a perspectiva de uma guerra contra outro país,
MARCELO
Vamos, sentemos, e quem souber, que me diga
Por que essa severa e incansável vigília,
Noite após noite, esgota os súditos da terra;
Por que a fusão diária desses brônzeos canhões,
E a compra no exterior de máquinas de guerra;
Por que a conscrição de artífices navais
Num trabalho que funde o domingo à semana;
Que coisa está no ar, que essa pressa suarenta,
Lança a noite a uma faina em consórcio co’o dia.
Será que alguém me pode informar?
(vv.74–82)
Acrescentemos as suas maquinações, que começam a se desenrolar até o descontrole, levando Ofélia à loucura e, por fim, à morte dela e de seu irmão Laertes que é envenenado acidentalmente durante o duelo final, ao qual ele desafia, como vingança, o mesmo Hamlet; o ardil que usou para matar Guilderstern e Rozencrantz e a já mencionada peça armadilha, que é a um só tempo uma história dentro de outra história e uma espécie de flash back, que esclarece as circunstâncias do assassinato, melhor ainda, Hamlet não é apenas uma peça de ação, é por si mesma a própria ação e até as meditações não se destacam, inconvenientemente, como pavões da sabedoria, por encerrarem menos uma lição dos romances, ainda numa perspectiva benjaminiana, que serem instrumentos dessa ação, como bem podemos observar no já referido discurso edificante que o rei Cláudio faz a Hamlet, que a um só tempo pode (1) revelar a dissimulação de quem o profere, (2) o incômodo real que quem o profere revela com os efeitos do assassinato que cometeu e, de sobra, (3) dá uma piscada de sabedoria ao público ávido por lições edificantes. De qualquer maneira, por artificioso ou dramaticamente inexplicável possa soar, o já mencionado discurso de Malcolm, em Macbeth, traz à baila os princípios que coordenam este ensaio.
A presença e reinado de Cláudio, ao menos aparentemente, não ameaçam a estabilidade do reino nem criam uma sensação de insegurança em quem lhe está mais próximo. Se há uma ameaça ao reino, como aliás é sugerido logo no início da peça, não tem nada que ver com o fato de ser um rei ilegítimo, e sim com um desejo de vingança de Fortimbrass, príncipe da Noruega, também espécie de duplo mais atrevido da personagem título, que quer vingar o pai, que ora se encontrava doente, tomando de volta um pedaço de terra que este, numa aposta, perdeu para o pai de Hamlet. Ou seja, muito da crise atual não se deve ao regicídio e a um casamento incestuoso, e sim aos desmandos do rei assassinado, cujo fantasma ainda se prende a questões que não deveriam ser mais de sua preocupação, tal como os que assombram uma casa por conta de um tesouro enterrado, como se este alguma serventia lhe tivesse. O tio de Hamlet também não vê necessidade de matar Hamlet nem qualquer outra pessoa da estima do Hamlet pai como uma forma de assegurar sua permanência no trono, como ocorre tanto a Macbeth bem como a Ricardo III, que matam filhos, inclusive crianças, irmãos e amigos de seus antecessores, preferindo antes os ardis das mentiras, só chegando a atentar contra a vida de seu atormentado sobrinho quando se lhe tornou evidente que este lhe estava ameaçando a reputação e a vida, inclusive esse rei insiste em que Hamlet não saia do país, que permaneça a fim de se preparar para assumir o trono.
Palavras, palavras, palavras
A descrição física de Ricardo III e o mal que faz só têm força persuasiva nessa peça e a quem leu apenas a ela, sem que tivesse passado pela peça Henrique VI por meio da qual sabemos pormenores de sua vida pregressa. Dessa maneira, as vítimas do corcunda infernal perdem, ao menos parcialmente, a reputação vitimária, como de resto o professor e ensaísta João César de Castro Rocha, numa palestra, notou numa passagem da peça Hamlet, na qual a personagem título tenta convencer a mãe da superioridade moral de seu pai em relação ao seu tio, menos para convencê-la que convencer a si mesmo, uma vez que, quanto mais procurava motivos para vingar o pai, menos os encontrava e, ao que tudo indica, Castro Rocha tem razão, uma vez se tratar de uma exposição verbal caricaturalmente retórica, cheia de figuras de linguagem análogas a de um demagogo, é aquele momento em que um discurso “fraco” da peça, sendo um recurso poético, assim se concebeu a fim de esclarecer a fraqueza vaidosa da personagem ou traduz pouca convicção:
HAMLET
Olhe esse retrato bem, e este outro aqui,
A efígie figurada desses dois irmãos.
Olha só quanta graça paira nessa testa:
Um semblante de Zeus, com cachos de Hipérion,
Uma fronte de Marte que ameaça e comanda
Um garbo semelhante ao do arauto Mercúrio
Brilhando sobre um píncaro que roça o céu!
Realmente uma forma e um belo combinado
Onde, parece, cada deus deixou seu cunho
Para ofertar ao mundo o estalão de um homem.
Este era o seu marido. Agora veja o outro,
Seu atual marido, um grão já com caruncho,
Infectando o íntegro irmão. Você não vê?
(Ato III, cena IV, vv. 53–65)
Articulando essa tentativa desesperada para convencer a mãe das qualidades do pai pela tentativa de diminuir a qualidade do tio, e com a advertência que este fez a Hamlet contra sua “postura de teimosia ímpia”, podemos perceber que o príncipe da Dinamarca, mais do que odiar constrói intelectualmente esse ódio e, por incrível que possa parecer, essa operação mental resulta numa destruição de alma de tal proporção que o torna não apenas rival na maldade com os já citados vilões, mas os supera, além de falhar como artista, conforme vimos nas especulações de Auden. Shakespeare, num surpreendente lance de gênio, estrategicamente abre mão de uma poesia genial em favor de um poema meramente convencional, apelando desavergonhadamente, por meio da imitação literária, a todos os vícios retóricos da sua época,²⁷ para servir a um só tempo como símile do quão pouco Hamlet se sentia seguro a respeito do que estava dizendo, e movido por essa incerteza exagera nas imagens laudatórias (vide as comparações com figuras mitológicas, “Marte”, “Mercúrio”, “Hipérion”, tão ao gosto do renascimento) e como símile da operação mental que tem o ódio como combustível. O que Hamlet põe em prática, é o que Margaret, em Ricardo III, ensina a outras vítimas do déspota, dando assim a impressão de que o príncipe da Dinamarca leu este trecho:
ELIZABETH
Mestra das pragas, fica um pouco ainda!
Me ensina a maldizer meus inimigos!
MARGARET
Afasta o sono à noite, passa o dia
Em jejum; pesa as mortas alegrias
Co’as mágoas vivas, pensa nos teus filhos,
Vendo-os mais lindos do que na verdade;
Julga o assassino ainda pior do que é:
Exaltando o passado, aumenta o ódio.
Isso te ensinará a praguejar.
(Ato 4, cena 4, vv. 126–34, trad. Amélia Carneiro de Mendonça e Bárbara Heliodora)
Esse ódio que se constrói, que se manipula, manifesta-se também em personagens contemporâneas, tal é o caso da personagem principal de Plataforma, de Michel Houellebecq, que perdendo Valérie num atentado terrorista alimenta incessantemente o ódio pelo Islã, ódio esse que, após a morte da amada, se torna o sentido único em sua vida com a mesma intensidade do amor que sentia por ela,
Pode-se continuar vivo insuflado apenas por um sentimento de vingança; muita gente vive assim. O islã tinha destruído a minha vida, então o islã era sem dúvida algo que eu podia odiar; nos dias seguintes me esforcei para sentir ódio aos muçulmanos. Consegui sem muito esforço, e voltei a me interessar pelas notícias internacionais. Sempre que ouvia que um terrorista palestino, ou uma criança palestina, ou uma mulher grávida palestina tinha sido abatida por uma bala na faixa de Gaza, sentia um arrepio de entusiasmo com a ideia de que era um muçulmano a menos. Sim, podia-se viver dessa maneira.²⁸
e a do velho que não queria perdoar seu filho em Na relva de tua lembrança, de Herberto Sales,
O cavaleiro Perlino não queria ver o filho, com medo de perdoá-lo. (…) Se o que ele contou aqui foi verdade (disse Emílio, o pintor) talvez melhor seria que o filho o tivesse matado, do que ele ter escapado da morte com todo esse ódio. Estávamos assim os três, em volta daquele ódio como em volta de uma mesa. (P. 99, Rocco, 1988)
ou Henry, em Fim de caso, de Graham Greene, numa prece invertida, “Ó Deus, Você já fez o bastante, já me privou do bastante, estou cansado e velho demais para aprender a amar, deixe-me em paz para sempre.”²⁹ Ainda em Ricardo III, a personagem título, numa passagem icônica, impõe a si mesmo o desafio de conquistar o coração de lady Anne no exato momento em que esta pranteava o marido, cujo corpo estava sendo conduzido num cortejo, marido esse que ele mesmo, Ricardo, matara:
RICARDO
Se tens um coração que não perdoa,
Olha, aqui tens este afiado gume;
Se o queres esconder em peito amante
E libertar esta alma que te adora,
Eu o ofereço aberto ao rude golpe,
E peço a morte, humilde e de joelhos.
(Fica de joelhos e ela avança com a espada.)
Não hesites, pois eu matei Henrique,
Mas foi tua beleza que o exigiu.
Vamos, golpeia; assassinei Eduardo,
Mas foi teu lindo rosto que o mandou.
(Ela deixa cair a espada.)
Apanha a espada ou fica, então, comigo.
ANNE
Levanta, falso; quero ver-te morto,
Mas não hei de ser eu o teu carrasco.
RICARDO
Diz-me então que me mate, eu o farei.
ANNE
Isso eu já disse.
RICARDO
Foi em meio à raiva:
Diz outra vez, e só com essa palavra
A mão que já matou o amor menor
Por teu amor mata este amor maior.
De ambas as mortes tu serás culpada.
ANNE
Quisera conhecer teu coração.
RICARDO
Está desenhado em minha fala.
ANNE
Creio que ambos são falsos.
RICARDO
Então é falso o homem.
ANNE
Bem, guarda a tua espada.
RICARDO
Diz que estamos em paz.
ANNE
Isso verás depois.
RICARDO
Mas terei esperança?
ANNE
Só dela vive o homem.
RICARDO
Toma, aceita este anel.
ANNE
Tomar não é ceder.
(Coloca o anel no dedo.)
(Ato I, cena II, vv. 181–209, tradução Amélia Carneiro de Mendonça e Bárbara Heliodora)
Nos trechos anteriores, o discurso da viúva ainda refletia os sentimentos de ódio, repulsa e tristeza. Porém, na medida em que Ricardo insiste nas suas razões, mais a sua forte emoção vai dando lugar a perda das convicções que sustentavam os sentimentos do início, mais ela vai baixando o escudo de emoções contra ele e o discurso de resistência continua menos como reflexo do que estava sentindo que como um disfarce de um novo sentimento que estava surgindo naquele instante, tanto que acabam por se casar pouco tempo depois, ou podemos ainda dizer que se por um lado ela se desarmou diante dele por outro prosseguiu no já dito discurso de resistência como uma maneira, aliás cada vez mais frustrada, de manter intelectualmente o ódio, a repulsa e a tristeza, ela tenta recuperar racionalmente o que perdera emocionalmente, que é exatamente o que Hamlet tenta fazer; Anne oscila entre dois sentimentos autênticos, o de luto pelo marido assassinado e o estar convencida pelas justificações do assassino, até ser vencida pela sedução deste, e o príncipe, por sua vez, começa por um sentimento autêntico de luto e de ódio, que diante de uma situação nova não mais se sustenta em sentimentos genuínos, restando como apoio apenas uma retórica de salão.
E assim, de artifício em artifício, de dissimulações que se acumulam, de autojustificações, Hamlet vai colecionando vítimas, quando o verdadeiro alvo só é atingido no final. Num impulso, pensando que era o tio escondido atrás de uma cortina enquanto conversava com sua mãe, apunhala Polônio levando-o à morte e, como consequência, intensifica a loucura de Ofélia, sua filha; mesmo após ter percebido o triste engano, após oscilar entre o arrependimento e certo cinismo, acaba por fazer pouco caso do morto, tecendo comentários de mau gosto e de humor negro ao seu triste destino, recordando Auden, “com notável ausência de sentimento”:
(…) Quanto ao senhor aqui
Eu me arrependo – e muito –, mas prouveram aos céus
Que eu fosse o seu castigo e ele fosse o meu,
Que eu fizesse a função de algoz e de ministro.
Eu cuido dele – pois terei de responder
Por sua morte. Então, boa noite outra vez.
(Ato III, cena IV, vv. 174–9)
——————————————————-
Esse aqui me forçou a aprontar os pacotes.
Eu vou jogar suas tripas lá no quarto ao lado.
Mãe, boa noite. Mas como esse conselheiro
Ficou tão mais grave, tão discreto, tão mudo.
Ele que era um canalha parvo e linguarudo.
Venha, senhor: vamos dar fim a esse teu caso.
Boa noite, mãe.
(Sai arrastando Polônio. A rainha permanece.)
(vv. 213–19)
Não hesita, ainda antes de lhe matar o pai, em deixar Ofélia, em boa parte da peça, num estado de confusão, sendo jogada de um lado para outro entre promessas amorosas e afetação de desprezo, e sem contar que já estava insegura por conta da diferença de estado social entre ela, uma plebeia, e um príncipe, e tudo isso em nome da estratégia de fingir loucura a fim de lograr a vingança tão desejada, até que, com a morte de Polônio, ela se entrega de vez à loucura e, caindo de uma árvore, na qual escalou para apanhar uma flor, afoga-se num rio. Como esse acontecimento foi interpretado como suicídio, o clero quis negar o enterro cristão, senão condenando sua alma ao inferno, com certeza a pôs em risco, como de resto ele quis para o rei, “e a pobre, à espera/ de um olhar, feneceu, virou figura.”, recorda-nos Bruno Tolentino, num poema dedicado ao caso (“O verme”, IV, O mundo como idéia). Auden, já citado aqui, pergunta: “Hamlet alguma vez foi realmente apaixonado por Ofélia? Ele diz que sim no final(…) Mas podemos ter dúvidas. A repulsa anterior por ela são, de qualquer modo, desproporcionais ao que vemos da relação deles e mal motivados.”³⁰ Esclareço que esse “mal motivados” não diz respeito à estrutura psicológica da personagem, e sim uma crítica que Auden faz ao descuido do Bardo em esclarecer poeticamente qual é a verdadeira dinâmica que determina a relação desse casal.
Em tempo, essa interpretação do clero parece-me incongruente na trama. Como é de se esperar numa peça, sabemos o que aconteceu com uma personagem a partir do relato de outra personagem, que é uma testemunha, ou pelo coro. E conforme o relato da rainha, que desempenha o papel narrativo, houve inequivocamente um acidente, não uma intenção de se matar. Na loucura Ofélia não percebeu o perigo a que se estava expondo e morreu por isso. Talvez numa das versões Ofélia cometeu um ato inequívoco de suicídio, porém o Bardo, por descuido, modificou o trecho, transformando o suicídio em acidente, sem modificar o restante das falas para conformá-las a essa mudança. Afinal, qual é a dificuldade de interpretar uma desastrada tentativa de pegar uma flor no alto de uma árvore como um acidente fatal, movido pela loucura, e não como uma forma de buscar a morte deliberadamente?
Seja como for, poder-se-ia dizer que todos os que cruzaram o caminho de Hamlet, feneceram, e de tão obstinado estava em matar o rei, nem mesmo a si mesmo via, só via a morte que queria causar, mais uma vez com Tolentino, “o olhar de louco/ que deu ao mundo pôs a vida ao largo(…)//// via só a verdade ou a mentira,/ as noções, era todo uma impostura/ denunciando outra…” e assim, amigos e inimigos se fundiram num só vulto, indiferenciaram-se, tornaram-se a seus olhos, todos, figuras.
Notas
- Penguin/Companhia, 2015
- A arte sagrada de Shakespeare – O mistério do homem e da obra, Polar Editorial, 2004, trad, Mateus Soares e Sérgio Sampaio, pp. 68-9
- Op. cit. p. 69.
- Op. cit. p. 69.
- Pp. 70–71.
- P. 69.
- Hamlet, introdução, p.15, Penguin e Companhia, 2015.
- P. 68.
- Presságios do milênio: anjos, sonhos e imortalidade, trad. Marcos Santarrita, Objetiva, 1996, com destaque ao “Prelúdio: autodependência ou simples gnosticismo.”, pp. 19–34
- Hamlet, Introdução, p. 11, Penguin-Companhia, 2015,
- Pp. 11–12, 2015.
- Lawrence Flores apresenta uma base histórica para esse sentimento na introdução à sua tradução em “Tempo histórico”, pp. 16–24, 2015.
- Confissões, trad. Maria Luiza Jardim Amarante, ed. Paulus, 1997, Coleção Patrística.
- Lings, Martin, p. 69.
- Acredito que Harold Bloom se identificaria muito com essa passagem. No primeiro capítulo de seu Presságios do milênio, p. 19, escreve o seguinte: “Além de seus outros poderes sobrenaturais, Shakespeare me dá a constante impressão de saber mais do que qualquer outro jamais soube. A maioria dos estudiosos chamaria de ilusão essa impressão, mas, para mim, parece a verdade pragmática. Conhecer a mim mesmo, conhecer Shakespeare e conhecer Deus são três buscas separadas mas intimamente relacionadas.”
- Lings, Martin, p. 52.
- Aulas sobre Shakespeare, trad. Pedro Sette-Câmara, Editora Âyiné, 2022, (kindle) posição 5924.
- “Hamlet”, Sobre Shakespeare, trad. Simone Lopes Neto, Edusp, 2011, pp. 115–16.
- Auden, W. H., posição 5972.
- Op. cit. posição 6013.
- Posição 5907.
- Posição 5972.
- Posição 5894.
- Macbeth, Tradução de Daniel Jonas, p. 126, Penguin Random House Grupo Editorial, 2023.
- “O narrador: Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov”, p. 219, in Magia e técnica, arte e política – Ensaios sobre literatura e história da cultura, tradução de Sérgio Paulo Rouanet, ed. Brasiliense, 2016.
- P. 129.
- “Embora de início Hamlet declare não estar adaptado aos novos hábitos – ele tem naturalmente uma dívida com seu pai defunto –, ele não é impermeável ao inautêntico mundo de ‘aparências’. O tempo de Elsinore é aquele em que a palavra não acompanha o ato e nem o ato, a palavra. É o mundo cortesão do século XVI, uma esfera da manipulação(…) do consumo manipulativo da palavra.” Lawrence Flores, introdução à peça Hamlet, p. 19, 2015.
- Ed. Afaguara, trad. Ari Roitman e Paulina Wach, 2018, posição 3420.
- Ed. Record, trad. Léa Viveiros de Castro, p. 177.
- Auden, W. H., posição 5933.